14 de ago. de 2007

O primeiro dia

Será que eu estacionei na vaga do chefe?
Não, não. Não é possível.
Seria muito azar pra um primeiro dia só.
Digo, pra um primeiro dia de trabalho só.
Isso está me lembrando a época do colégio.
1994, Oitava Série A da Escola Pio XII.
Era o primeiro dia de aula e como eu não conhecia ninguém,
achei por bem chegar com duas horas de antecedência.
Assim, vendo os alunos entrarem um de cada vez a ansiedade seria menor.
Era o princípio das doses homeopáticas sendo aplicado na prática.
Princípio que teria funcionado se não fosse por um detalhe infeliz:
Eu tinha entrado na sala errada. O resultado já dá pra imaginar.
Fui obrigado a me dirigir para a sala certa que a essas alturas já estava completamente lotada e a professora, ah aquela desgraçada, ainda fez questão que eu explicasse pra turma inteira o motivo do meu atraso.
Até hoje, esse é um trauma que ainda não foi superado.
Agora estou aqui no primeiro dia de trabalho, quase 20 anos depois.
Cheguei à 7:30 pra um expediente que só começa depois das 9:00.
Por enquanto só conheci o Joílson, o manco da limpeza.
Como ainda não sei o meu lugar, resolvo ficar perambulando pela sala.
Observando os porta-retratos nas mesas e os adesivos nos monitores,
vou tentando deduzir as personalidades de cada um dos meus colegas.
É quando começa a bater a insegurança: será que eu estou bem vestido?
Ou pior, será que estou com mau hálito?
Sim, porque o primeiro dia de trabalho define toda sua reputação dentro de uma empresa. Principalmente quando o assunto são os apelidos.
Uma falha no primeiro dia e você fica conhecido para sempre como o cara do bafo, o cara da calça rasgada ou ainda como o cara que deu em cima da recepcionista.
Aos poucos, as pessoas vão entrando na sala.
O nervosismo atinge níveis cavalares. Fico torcendo por uma catástrofe.
Um incêndio no prédio vizinho. Joílson entrando com o corpo em chamas.
Qualquer coisa que tirasse a atenção sobre o novato, nesse caso, eu mesmo.
Acontece que para minha surpresa a sensação de desespero vai diminuindo.
Meus novos colegas parecem ser a simpatia em pessoa.
Começo a aceitar a idéia de cada um deles vai fazer o máximo pra que eu me sinta à vontade nesse novo emprego. Melhor pra mim.
O chefe entra na sala e, sem fazer cerimônia, grita pra todo mundo ouvir:
Quem é o filha da puta do Corsa preto?